sexta-feira, 22 de julho de 2011

O Axé das Ervas



Muito antes do surgimento da escrita, o homem primitivo já experimentava a diversidade de plantas ao seu dispor, classificando-as consoante a sua potencialidade: alimentação, medicina, veneno, alucinogénicos. O conhecimento sobre as potencialidades das plantas tem, por isso, a sua raíz na nossa ancestralidade, sendo que estas foram objecto de estudo de várias civilizações, ao longo dos tempos. A necessidade humana em conhecer e usar a natureza à sua volta para dela retirar benefícios, levou a que se encetasse esta jornada. A utilização de algumas plantas com capacidades de cura fizeram destas os primeiros recursos terapêuticos e uma das primeiras formas de manifestação do homem.

Registos escritos sobre a forma de utilização e efeitos são vários e chegam-nos de diversas épocas e pontos do planeta, desde os Chineses em 3000 a.C. aos Aztecas no Século XVI. Os primeiros relatam a importância das plantas em cerimónias de magia e de medicina, havendo também referências a outros usos, nomeadamente na alimentação.

O registo escrito mais antigo de que dispomos data do ano 3700 a.C. e consiste num tratado médico deixado pelo imperador chinês Shen Nung, onde afirmava que, para cada doença existia uma planta, que forneceria um remédio natural.

No entanto, o mais conhecido denomina-se Papiro de Ebers e tem a sua origem no Antigo Egipto, por volta de 1500 a.C., contendo centenas de fórmulas e remédios. Foi descoberto pelo egiptólogo alemão George Ebers. Os egipcíos tinham bastantes conhecimentos sobre o uso de plantas, recorrendo a estas para diversos e variados fins, tais como: alimentação, medicina, cosmética, embalsamento, incensos, óleos para dores musculares e relaxamento, entre outras. A história da aspirina, por exemplo, pode ser remontada até ao Antigo Egipto. Do Antigo Egipto chega-nos um famoso médico da antiguidade – Imhotep.

Da Mesopotâmia, actual Iraque, e berço da civilização humana, chegam-nos registos em placas de barro datadas entre 3000 e 2000 a.C. que dão conta de trocas comerciais de plantas.

Da Índia temos registos que datam aproximadamente do ano 2500 a.C., nomeadamente o Athatva Veda, e que indicam que o consumo e uso de ervas tinham a finalidade de prolongar a vida. Um facto curioso é que os hindus acreditavam que apenas os puros e piedosos podiam colher as plantas e que estas deviam crescer longe da vista humana e do pecado, pois estas eram “as filhas predilectas dos deuses”, assumindo por isso uma posição divina.

Na Grécia, no Século XIII a.C., teve lugar o aparecimento do primeiro “spa” de que se tem conhecimento, bem como a existência de diversos templos de cura que recorriam às propriedades terapêuticas das plantas. Os gregos fizeram um esforço em compilar o conhecimento que lhes chegou de várias partes do mundo conhecido, nomeadamente da Índia, Babilónia, Egipto e mesma da China. O filósofo Aristóteles (384-322 a.C.) e o seu discípulo Teofrasto (370-286 a.C.) foram os criadores do primeiro sistema científico de classificação botânica.

Durante a Idade Média, devido às dificuldades criadas pela Igreja ao progresso científico, os estudos médicos das plantas restringiram-se aos monges nos mosteiros e a algumas mulheres em aldeias remotas. Além disso, a Igreja considerava as doenças como castigo divino e, portanto, não passíveis de intervenção humana. Este facto levou a que o estudo sobre o uso de plantas ficasse limitado ao mundo árabe. Neste contexto, é de salientar o esforço dos persas em traduzir o trabalho realizado pelos gregos, continuando assim o seu estudo.

No Renascimento, Século XV, deu-se o regresso do estudo sobre plantas ao Velho Continente, sendo esta uma era dourada neste campo, onde se fizeram inúmeras descobertas de curas para várias doenças. Houve uma centralização sobre o estudo das plantas, o qual passou a ser proibido às mulheres e curandeiros não profissionais. Quem o fizesse seria considerado herege. No século XVI, um suíço chamado Philippus Aureolus Theophrastus percorreu a Europa, contactando com curandeiros, parteiras e feiticeiros, em busca do conhecimento sobre plantas e minerais. Mais tarde viria a ser conhecido como Paracelso, o fundador da Alquimia e precursor dos conceitos da influência cósmica sobre as plantas e as suas relações com os quatro elementos – terra, água, fogo e ar.

Já na era dos Descobrimentos, os povos europeus observaram e registaram o uso de ervas pelos nativos para fins medicinais e alimentares. Estes povos nativos não possuiam mais do que alguns registos sobre a forma de pinturas rupestres, sendo, no entanto, plausível que estes recorressem às plantas para a sua dieta e medicina desde a sua chegada ao continente americano, há cerca de doze mil anos. Quase todo o conhecimento sobre a flora brasileira foi descoberto por cientistas estrangeiros, especialmente os naturalistas, através da realização de expedições científicas ao Brasil, desde os descobrimentos portugueses até ao final do século XIX.

Com o advento da Revolução Industrial e o início da Era Moderna, final do Século XIX, o Homem foi capaz de sintetizar partes das plantas, fazendo com que a medicina natural fosse ridicularizada, pois era considerada como ultrapassada. No início do Século XX, o uso de plantas deixou de ser comum. Contudo, recentemente esta tendência tem vindo a mudar com o ressurgimento da medicina natural, nomeadamente no uso destas como complemento a certos tratamentos, cujos efeitos secundários dos medicamentos são nocívos.

Também ao longo de toda a história da Humanidade, encontramos a utilização das plantas em quase todas as religiões ou cultos religiosos, não apenas associada à cura e tratamento de doenças, a medicina natural, mas também como elementos ritualísticos e magísticos, capazes de facilitar a ligação do ser Humano com o plano espiritual. Em todos os povos e culturas, as ervas tornaram-se conhecidas pelas suas propriedades para repelir energias negativas, afastar o mal ou proteger de azares, bem como pela capacidade de atrair energias positivas, boa sorte e fortuna.

Tanto na pré-história como nas civilizações da antiguidade, o curandeiro ou homem da medicina era, simultaneamente, o sacerdote ou líder espiritual, acumulando, por inerência às suas funções, todo o conhecimento medicinal com o conhecimento religioso e espiritual. Assim, ao longo dos séculos, feiticeiros, xamãs, curandeiros e sacerdotes, foram conhecendo as propriedades energéticas e espirituais de cada planta e aprendendo a utilizá-las como elementos preciosos para estabelecer a comunicação com as divindades e espíritos dos antepassados, bem como para alcançar o equilíbrio espiritual desejado.

Tal como aconteceu noutras religiões, a Umbanda herdou das suas raízes, principalmente da africana e indígena, o conhecimento da utilização das ervas (folhas, flores, raízes, sementes, etc.) tanto a nível medicinal como magístico e espiritual. Este conhecimento chegou da antiguidade até aos nossos dias, não só através da transmissão oral do conhecimento popular, de geração em geração, e dos estudos científicos realizados ao longo dos séculos, mas também do plano astral, através das entidades espirituais, nomeadamente daquelas que mais viveram em comunhão com a natureza, como é o caso dos Caboclos, Pretos-velhos e Boiadeiros.

Na Umbanda, para além do uso terapêutico, as ervas são utilizadas tanto para a limpeza energética, como para a imantação ou energização de pessoas, ambientes ou lugares. Esta utilização é feita de várias formas que vão desde os banhos e amacis de ervas, passando pelo fumo resultante da combustão de elementos vegetais na defumação ou no queimar de um charuto, até à simples utilização das folhas verdes durante um “passe”. Quem não conhece os banhos de descarrego ou defesa, a famosa arruda utilizada pelo Preto-velho ou ainda o charuto do Caboclo?

Para além das propriedades químicas, cada planta possui qualidades energéticas que são nada mais, nada menos, do que a Energia Vital da homeopatia, o Prāna dos Hindus, o Qi dos chineses ou simplesmente o Axé da Umbanda. Cada planta carrega a vibração energética de um ou vários Orixás e é a manipulação destas energias, associada a outros elementos magísticos, que os Guias e sacerdotes da Umbanda utilizam como recurso para estabelecer ou restabelecer o equilíbrio energético e espiritual.

Dependendo da necessidade, problema ou situação, entidades e sacerdotes recorrem a uma ou mais ervas, de acordo com o conhecimento que possuem sobre as suas qualidades energéticas e formas de utilização, para que actuem atraindo ou activando as vibrações de um ou mais Orixás, obtendo assim a harmonia e o equilíbrio físico, mental, emocional ou espiritual necessário. Da mesma forma, utilizam o “sangue vegetal” portador de essências divinas, para eliminar e transmutar as energias negativas, limpando ambientes e pessoas. As ervas são verdadeiras dádivas divinas e são essenciais na ritualística de Umbanda. Exemplo do seu valor e importância, é a defumação realizada no início da Gira, essencial para a limpeza e purificação do ambiente energético do terreiro e desobstrução e alinhamento dos chacras dos médiuns, contribuindo para uma maior capacidade de concentração, elevação do pensamento e, consequentemente, uma maior aproximação dos Guias.

Actualmente, assistimos a um renascer do interesse cada vez maior da ciência pelo poder das plantas, através do estudo e desenvolvimento das chamadas medicinas naturais ou alternativas. Terapias baseadas nas propriedades das plantas, como a fitoterapia e os florais, são hoje reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde. Conhecimentos milenares, que hoje a ciência redescobre, são preservados e postos em prática diariamente, não só dentro dos templos de Umbanda e de outros cultos afro-brasileiros, como no seio de outras religiões.

FONTE: http://raizculturablog.wordpress.com/2009/01/21/ervas-e-seu-uso-ancestral/; http://www.ervasdositio.com.br/


Bernardo Cruz e Fred Marques - A.T.U.P.O.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Quebrar Correntes


Saudações, Irmãos de Fé!

No mês de Maio, comemorou-se o dia dos Pretos Velhos,

nossas queridas entidades de Umbanda, sinônimo de humildade,

sabedoria e, acima de tudo, de uma vida sofrida que tiveram em

suas passagens na Terra, no cativeiro em senzalas, onde o negro era

visto como um animal acorrentado, não podendo, na maioria das

vezes, ter uma vida em família e sendo impedido de praticar seus costumes e sua

religião. No dia 13 de Maio, é também celebrado o dia em que as correntes que

aprisionam o negro brasileiro se partem: dá-se a Liberdade através da abolição da

Escravatura, com a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel.

Pois bem, esta introdução falando do Negro Brasileiro e da Lei Áurea lembra-nos o

porquê de existir a figura do Preto-velho em nossa Umbanda ou do negro escravo em

solo brasileiro, que, apesar de acorrentado durante mais de 300 anos no Brasil,

lutou sempre, não deixando morrer seus costumes,tendo mantido suas origens no que

diz respeito à sua religião! Adaptou-se, lutou por sua liberdade e contra a tirania

do homem branco e não perdeu a esperança!

Hoje o Preto-Velho desce nos terreiros e templos de Umbanda, na sua divina

sabedoria, ensinandonos a termos paciência, a não desistirmos, mostrando que não é

tão difícil, que devemos carregar a luta e a esperança gravadas na alma e, acima de

tudo, nos ensinando que devemos quebrar as nossas próprias correntes e aceitarmos a

nossa liberdade e não esperar que venha uma princesa Isabel assinar uma Lei que nos

dê a liberdade e o poder de escolher!

Negro velho diz: “ Isso vocês já possuem”!

Por isso, meus irmãos, quebrem as vossas correntes e vivam!

Salve a sabedoria dos Pretos Velhos e Adorei as Almas!

Pai Cláudio de Oxalá

Sacerdote de Umbanda | ATUPO -Templo de Umbanda Pai Oxalá